domingo, 5 de junho de 2011

Feira popular é tema de desenho animado

As peripécias de um garoto, em meio à feira livre de Limoeiro do Norte, são contadas em filme feito por crianças

Todo processo de criação, produção e gravação foi realizado na a Associação Carnaubeira, com participação de crianças e jovens
Russas Já está correndo pelos festivais de cinema do Ceará e de outros Estados o filme "Feira da Fantasia", produzido pelos jovens da Associação Carnaubeira que traz as peripécias vividas por um garoto em meio à feira popular. O curta-metragem em animação é o mais recente trabalho da ONG, um verdadeiro celeiro cultural no Vale do Jaguaribe. Fazer filme também é só uma das várias atividades dos jovens, que exercitam do desenho à concepção digital do trabalho audiovisual.

Antes da carnaubeira, a maioria dos meninos nunca tinha mexido em computador. Mas não é que se queira só destacar o trabalho social para que adolescentes e jovens usem as ferramentas tecnológicas no interior do Ceará. O que tem acontecido é o acesso à tecnologia e o uso criativo dela. "A Feira da Fantasia", um desenho animado de pouco mais de dez minutos, foi totalmente produzido entre as paredes da ONG Carnaubeira, no distrito de Flores, em Russas. E não é por mérito social, e sim por qualidade técnica, que o filme foi selecionado para concorrer nos festivais de cinema em Maringá (São Paulo), Mostra de Cinema Infantil de Florianópolis (Santa Catarina) e II Festival de Cinema Digital de Jericoacoara. Esses são os primeiros.

Universo do comércio sertanejo foi escolhido para ser tema de animação. Os adolescentes, atendidos pela Associação Carnaubeira, desenvolveram do texto à edição
FOTOS: REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO
Roteiro
"Feira da Fantasia" traz Miúdo, um garoto de dez anos, que mora na Chapada do Apodi, em Limoeiro do Norte, e se encantou com as estórias contadas pelo pai, seu Antônio, sobre a feira popular no Centro da cidade. Depois de muitas recusas em deixar o filho acompanhá-lo nas compras na feira (foi lá que a mãe do menino morrera em acidente de trânsito), seu Antônio disse ´vamos´ para o menino que nem pensou duas vezes. Encantado e distraído com o universos de coisas e pessoas, e as estripulias dos artistas populares, Miúdo se perde do pai, que começa então uma busca desesperada.

O filme em desenho traz como cenários o Limoeiro antigo, entre os anos de 1920 e 1960, com base em fotografias da época. A trilha sonora foi feita, especialmente, pela Orquestra Carnaubeira, grupo da mesma associação. Teve regência do professor Nilo Pinheiro, com música de Talvanes Moura, diretor do filme e coordenador do Ponto de Cultura no qual está situada a Associação Carnaubeira de Arte e Educação.

Resultados
"Um destaque nessa produção é que todo o processo produtivo foi realizado 100% dentro do som das Carnaubeiras, ou seja, nenhum serviço foi contratado de fora, isso demonstra os resultados que o Ponto de Cultura produziu durante os seus nove anos de existência com a formação de agentes culturais, artistas e técnicos", afirma Talvanes. Os equipamentos também são todos de lá. Então a gravação de falas, sons, trilha sonora, bem como as técnicas de animação em storyboard, configuração de cenas, cenários e edição foram produzidas por eles, jovens entre 16 e 19 anos.

Todo a tecnologia usada no filme foi concebida a partir do uso de softwares livres. "Apesar da experiência adquirida, os jovens animadores nunca tinham trabalhado numa produção tão longa e séria, que exigiu uma qualidade técnica ao nível de outras produções nacionais. Foi preciso, muitas vezes, criar ou reinventar formas de produzir já que não se tinha muitos paramentos comparativos", explica Talvanes.

Artistas já conhecidos do Vale do Jaguaribe também deram suas contribuições: além do diretor do filme Talvanes Moura, já com trabalhos musicais e audiovisuais, figuraram o desenhista Diego Armado (direção de fotografia, já conhecido pelos desenhos em revistas norte-americanas), radialista e artista-plástico Cleudo Bill, na supervisão de arte-final do filme. Outro parceiro foi o músico e produtor cultural Khalil Gibran, que escreveu o roteiro do filme.

Objetivo

"É possível não só fazer arte como profissionalizar-se e viver disto no interior" Talvanes Moura, Diretor do filme e presidente da Assoc. Carnaubeira

"É um filme sobre o povo brasileiro. Nossos problemas são os mesmos" Khalil Gibran, Músico e produtor cultural

Melquíades Júnior
Colaborador

MAIS INFORMAÇÕES  
Associação Carnaubeira de Arte e EducaçãoDistrito de Flores - Russas (CE)
Telefone: (88) 3409.0090

EXPANSÃO
Associação espera ter apoio financeiro
Apesar de destacado trabalho na região, faltam recursos para as ações da Associação Carnaubeira, em Russas

Russas
Os trabalhos da "Carnaubeira" ganham destaque e visibilidade, mas nem sempre está na legenda das conquistas um importante fator: a dificuldade financeira para a manutenção de todas as atividades do grupo. E não são poucas: além de um núcleo de animação, com ilha de edição e demais equipamentos, possuem Orquestra Sinfônica, com todos os instrumentos necessários, espaços para realização de outras atividades socioculturais e artísticas, bem como profissionais para corresponderem a cada ação. Por falta de recursos, a escola de música da ONG está parada. A associação se mantém às custas de aprovação em editais, prêmios com retorno financeiro ou por meio das leis de incentivo.

"Quando não temos recursos simplesmente paramos e esperamos conseguir novo apoio para só então continuarmos. Temos períodos de atender a 150 jovens, em outros atendemos a somente 30, que mesmo sem professor ou recursos vêm para estudar e produzir trabalhos", explica Talvanes.

O projeto inteiro tem um custo mensal de R$ 3 mil, que inclui ajuda de custo de professores, com transporte e alimentação, luz, água, lanche dos jovens, material de expediente e de limpeza. É um valor irrisório, se comparado com gastos públicos da prefeitura de Russas somente em cerimônias de inauguração de pequenas obras, como na contratação de estruturas de palco, som e bandas de forró para anunciar obra de calçamento.

"Infelizmente não temos a parceria da prefeitura de Russas. Se tivéssemos esse apoio de manutenção o resto seria mais fácil com editais e outros parceiros. Temos muitos amigos profissionais que trabalham de forma voluntária", afirma Talvanes. Desde janeiro último as atividades da escola de música, um dos principais destaques da ONG, estão paradas. Os alunos aparecem para estudar, reúnem-se para tocar instrumentos, mas não há recurso para pagar o maestro.

Mesmo assim, criatividade e vontade não faltam para os "meninos da Carnaubeira". A associação pretende concluir, nos próximos anos, o Centro Cultural Carnaubeira, com a construção de novos espaços onde hoje já funciona o Ponto de Cultura. A pretensão é ser referencial do fomento cultural no Vale do Jaguaribe, com um teatro com capacidade para 240 espectadores, salas de aula, auditório, estúdios de áudio e vídeo, espaço verde com café cultural, tudo em 1.400 m² de área construída que já fazem parte da atual sede da Carnaubeira. O recursos financeiro obtido em editais e prêmios nacionais (como o Prêmio Asas, do Governo Federal), só deu para começar as obras. Falta mais apoio local.

Nenhum comentário: